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A infância foi vivida no campo, em contato com a natureza e entre os livros da silenciosa biblioteca de seu pai, onde leu textos de filosofia e teologia. Quando chegou à Universidade de Basiléia para estudar medicina, Jung detinha razoável conhecimento de filosofia, nutrindo especial interesse pelas idéias de Kant e Goethe. O seu entusiasmo filosófico leva-lo-ia, ainda, às idéias de Schopenhauer e às de Nietzsche, que exerceriam significativa influência na construção de sua teoria psicológica. Concluído o curso de medicina, Jung dedicou-se à psiquiatria, como assistente do professor Eugene Bleuler no Burgholzi Psychiatric Hospital, da Universidade de Zurich, interessando-se preponderamente pela esquizofrenia. O contato com a obra de Freud ocorreu através do livro A interpretação dos sonhos, cuja leitura por Jung deu-se em dois momentos. No primeiro, a obra não lhe causou impacto nem despertou interesse. Em segunda leitura, percebeu a extensão e a profundidade com que Freud tratou a questão dos sonhos. Essa leitura aproximou os dois maiores estudiosos do inconsciente numa amizade, fecunda e tumultuada, que durou cerca de sete anos. Nos primórdios de sua relação com Freud, Jung permaneceu receptivo à teoria da sexualidade infantil. Todavia, ao longo do tempo em que estudou e praticou a psicanálise freudiana, não conseguiu encontrar, nos seus fundamentos teóricos, elementos que dessem conta dos fenômenos com os quais se defrontava no tratamento de psicóticos, principalmente esquizofrênicos. Nesses pacientes, a doença decorria de grave dissociação da mente, não apresentando traços de uma etiologia sexual. A partir desse impasse, Jung desenvolveu estudos de alquimia, mitos e lendas na busca de elementos que contribuíssem para a elucidação das questões levantadas pela clínica da psicose. Foram principalmente essas questões que o fizeram demandar outras perspectivas de análise, tais como a abordagem simbólica e a hermenêutica. Com o instrumental teórico oferecido por esses métodos, identifica nos mitos, lendas e processos alquímicos a estrutura e a dinâmica psíquica por ele encontrados na clínica da psicose. A partir dessa constatação, são fundados os pilares em cima dos quais Jung afima que essa estrutura, enquanto forma, seria um componente da psique, presente em todos os indivíduos desde o nascimento, chegando então à sua hipótese mais refinada - a da existência de um substrato desconhecido na mente humana, responsável pelo lado obscuro da psique, que ele denominou de inconsciente coletivo que configura a dimensão objetiva da psique e contém o aprendizado resultante da experiência humana em todos os tempos, herdado pelo indivíduo como disposições ou virtualidades psíquicas. O inconsciente coletivo, dotado de propósito ou intencionalidade, cuja força energética repousa em elementos primordiais ou arcaicos denominados arquétipos, é determinante dos fatos psíquicos. Jung considera que é a psique coletiva, no seu embate com o ambiente externo e suas exigências, que gera o que ele denominou de inconsciente pessoal, e não as vicissitudes da pulsão como postula a teoria freudiana. Galileu, ao abandonar o finalismo e quaisquer considerações qualitativas no exame da realidade, marcou o início da ciência moderna: a física passa a apoiar-se exclusivamente em relações quantitativas e mensuráveis. Esse modelo, influenciado pelo racionalismo cartesiano, consolida-se com Isaac Newton, cujo método de investigação centra-se nas relações de movimento, base de quaisquer fenômenos encontrados na natureza. A
mecânica newtoniana vê o espaço e o tempo como entidades
dotadas de grandeza absoluta. As relações de movimento existentes
num universo dominado pelo espaço e pelo tempo constituem os pilares
da física, paradigma da ciência moderna, modelo que
foi extrapolado para as ciências biológicas, humanas e sociais.
Adotando postura empirista, Jung encaminha-se para uma abordagem fenomenológica do fato psíquico, com sustentação no método hermenêutico. Wilhelm Dilthey, filósofo neokantiano, que se preocupou fundamentalmente com as diferenças entre a metodologia das ciências naturais e a dos estudos humanos, aponta esse método como o mais adequado para as ciências humanas. A hermenêutica é a ciência da compreensão e da interpretação que constituem a especificidade das ciências do espírito. Como a dimensão inconsciente da psique é inacessível a um exame direto, o modo possível de investigação da realidade psíquica estaria fundado no exame e na interpretação dos seus produtos. Freud e Jung usam, ambos, o método interpretativo como caminho de aproximação da realidade psíquica. Na perspectiva freudiana essa interpretação é analítica, causal e reducionista. Enquanto do ponto de vista junguiano é amplificadora, finalista, prospectiva e sintética. O fato de Jung ter-se definido pelo finalismo não significa que tenha assumido algum tipo de irracionalidade em seu trabalho científico. O seu racionalismo não é de ordem cartesiana, mas sustenta-se na estrutura interpretativa, com metodologia fenomenológica. No corpo de sua obra, encontram-se referências em que ele opõe-se à interpretação metafísica ou sobrenatural da realidade psíquica, argumentando que o dado empírico ou fenomenológico é o único que conta e que pode ser examinado pelo estudioso da psicologia humana. J.J. Clarke1 diz que Jung estaria mais à vontade no ambiente científico contemporâneo, que parece romper com a linearidade do modelo newtoniano. De fato, o paradigma emergente sinaliza que a realidade escapa ao enquadramento linear, causal e mecanicista proposto pela ciência moderna. Para Jung a ciência é projeção psíquica dos cientistas e os modelos teóricos aproximações e não retratos fiéis da realidade. Nessa perspectiva, o conhecimento científico está mais perto de uma metáfora por meio da qual o mundo é interpretado que de um conjunto de dados articulados enunciadores de uma verdade confirmada. Para ele, cada teoria, como criação da mente, está subordinada à interioridade do cientista que a formulou, cuja realidade psíquica é projetada no mundo exterior na forma de teoria científica. Jung via a ciência como um mito destinado a explicar o universo cuja natureza íntima, para ele, permaneceria para sempre incognoscível. Essa visão é um dos pilares em que se assenta o quadro epistemológico do modelo científico emergente. Carl
Gustav Jung faleceu em 06 de junho de 1961. Criador da psicologia analítica
e reconhecido como um dos sábios do século, deixou significativas
contribuições científicas para o estudo e compreensão
da alma humana. Sua obra reflete profundo interesse pelas questões
espirituais, enquanto fenômenos psíquicos.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
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